Liberté, égalité, fraternité...
Liberdade, igualdade e fraternidade; eis o mote que agitou os sentimentos revolucionários dos franceses do século XVIII.
Doces palavras que encantam nossos ouvidos e que nos fazem desejar morrer por elas.
In cauda venenum, diz-se do escorpião. E se no escorpião o veneno está na cauda; nos homens ele se encontra escondido em palavras suaves e bajulações vazias.
Como é fácil deixar-se envenenar por elas!
"Lutemos pela liberdade, pela igualdade e pela fraternidade!"
Não é difícil encontrar o discurso acima escorrendo pelos lábios dos demagogos mais sanguinários que já passaram por essas paragens.
Não pretendo discorrer aqui acerca da doutrina iluminista que serviu de sustentáculo para o desenrolar dos acontecimentos revolucionários de fins do século XVIII; ater-me-ei tão somente a fatos históricos ocorridos na França revolucionária.
Basta-me dizer, entretanto, que o iluminismo estava apoiado em crenças perversas; mesmo não as conhecendo todas, isto podemos deduzir pelos seus frutos, pois, conforme disse Nosso Senhor:
Non potest arbor bona malos fructus facere: neque arbor mala bonos fructus facere. Omnis arbor, quæ non facit fructum bonum, excidetur, et in ignem mittetur. Igitur ex fructibus eorum cognoscetis eos. (Mt. 7, 18 - 20)
A árvore má não pode dar bons frutos...
Evidentemente há uma conjunção de diversos fatores políticos, econômicos e sociais que precipitaram as revoltas na França. A princípio nada de religião. Entretanto, fora o iluminismo que moldara o pensamento dos revolucionários, e como este era predominantemente anti-clerical, não demorou muito para que o aspecto anti-religioso do movimento viesse à tona de maneira brutal.
Em seu décimo artigo, assim se expressa a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão:
Article 10 - Nul ne doit être inquiété pour ses opinions, mêmes religieuses (...) (Ninguém deve ser incomodado por suas opiniões, inclusive as religiosas (...) )
No artigo seguinte, a Declaração reza pelos direitos de expressão da opinião.
A seguir veremos o quão perigosas essas idéias, quando afastadas da Verdade, são para as mentes e vidas. Que nossa geração possa aprender com os erros do passado, uma vez que
Historia magistra vitae
A história é mestra da vida...
Em maio de 1789, o rei Luís XVI convocou os estados gerais, ou seja, a nobreza, o clero e o chamado terceiro estado para que se pudesse solucionar determinados problemas que afligiam os franceses.
No entanto, rapidamente o clima esquentou durante as deliberações e o terceiro estado tomou à frente na direção das discussões e pleiteou a criação de uma Assembléia Nacional; além da promulgação de uma nova constituição.
É interessante vermos que os ideais iluministas já haviam conquistado uma camada relevante da nobreza e do clero. Se soubessem quão caro isto lhes custaria...
Conforme bem lembra Fustel de Coulanges,
quando a autoridade deixa de parecer legítima aos súditos, demora ainda um tempo até que assim pareça aos senhores; mas por fim acontece, e então o senhor, que já não acredita na legitimidade de sua autoridade, defende-a mal ou acaba por renunciar a ela.
Em um curto espaço de tempo as propostas do terceiro estado dominaram as massas que se deixaram seduzir pelos discursos revolucionários que procuravam injetar-lhes o veneno do ódio contra as classes dominantes: a nobreza e o clero.
Havia-se, então, encontrado um pretexto para jogar a população contra a Igreja: as propriedades que esta possuía. Começou-se, assim, uma intensa propaganda contra a Igreja Católica que, de um início sutil, desenvolver-se-ia em inúmeras atrocidades. A liberté havia sido apenas um pretexto...
Contrariamente ao que se propusera no décimo artigo da Declaração, a liberdade da Igreja começou a sofrer um fortíssimo cerceamento.
Por proposta do bispo de Autun, Talleyrand, o patrimônio da Igreja foi colocado à disposição do Estado. Em 1790 a Assembléia Constituinte suprimiu as ordens religiosas. Para os revolucionários, a regra da liberdade religiosa admitia exceções, exceções estas que se tornaram as regras de um governo cada vez mais brutal.
Um dos pontos culminantes desta tendência anti-eclesiástica é a criação da Constituição Civil do Clero.
Por este documento tomaram-se diversas medidas para enfraquecer a Igreja cada vez mais e torná-la apenas uma ferramenta do Estado, uma ferramenta provisória que em breve deveria ser descartada. Reduziu-se o número dos bispados de 134 para 83; eliminaram-se diversos benefícios e ofícios eclesiásticos; decretou-se a eleição popular dos bispos e padres, sem a necessidade de qualquer confirmação papal. A tentativa de destruição da Igreja francesa dava passos cada vez mais largos.
E os defensores da liberté obrigaram todos os eclesiásticos a jurar fidelidade à constituição civil. É-nos fácil imaginar a confusão que tomou conta da Igreja francesa: criou-se uma dupla Igreja. Por um lado, havia aqueles que haviam jurado fidelidade à constituição civil (sendo Talleyrand um dos primeiros a fazê-lo); por outro lado, a imensa maioria do clero francês recusou-se a ceder às pressões da Assembléia Constituinte e não fez o juramento.
A fidelidade a Cristo e à Igreja estava mantida por uma imensa maioria de sacerdotes.
Em 1791, a Assembléia Nacional Legislativa, substituta da Constituinte, empreendeu uma perseguição violenta àqueles que se recusaram a fazer o juramento. Estes sacerdotes, filhos fiéis da Igreja, foram presos e/ou deportados. O uso de hábito eclesiástico tornou-se proibido. Tudo em nome da liberté. Mais de duzentos sacerdotes encarcerados foram sumariamente assassinados nas prisões.
Finalmente chegou o tempo da apoteose da liberdade e da fraternidade: a guilhotina. Ela fez vítimas em todas as camadas sociais, espalhando o terror por toda a França. Qualquer ato que parecesse aos revolucionários como subversivo era suficiente para fazer sangue jorrar. A atenção dos revolucionários voltara-se então para os sacerdotes e religiosos que não haviam jurado ou que de certa forma representassem uma ameaça à Revolução.
Assim aconteceu às dezesseis carmelitas de Compiègne que diante da guilhotina renovaram uma a uma a profissão de fé nas mãos da priora. Enquanto esperava no cárcere, uma delas escrevia bravamente a sua vitória com as próprias palavras da revolução:
Allons...l’heure de la gloire est arrivée (Vamos...chegou a hora da glória).
Quantos foram os fuzilamentos e os afogamentos em massa!
Este regime revolucionário sabia que para acabar com a religião deveria acabar com os princípios morais e com a família. Facilitou-se o divórcio e revogou-se a lei do celibato eclesiástico.
A França estava afogando-se em seu próprio sangue...o sonho de liberdade, igualdade e fraternidade transformou-se no pesadelo da opressão e do caos.
O próximo passo dos arautos da liberté, égalité, fraternité fora dar início ao tão sonhado projeto iluminista de descristianização. Buscava-se abolir todo o passado cristão. Não mais se falava em “era cristã”, utilizava-se um calendário republicano. O domingo, principal dia de culto para os cristãos, foi abolido. O mês agora teria trinta dias subdividido em três semanas de dez dias. Ademais, para se substituir os dias santos, passou-se a denonimar cada dia do ano com o nome de um animal, planta ou árvore. Em 1793, o cristianismo foi oficialmente abolido da França.
Profanaram-se as Catedrais e demais igrejas com cultos à “deusa da razão”, muitas igrejas foram transformadas em armazéns ou estrebarias.
Duros momentos de uma época onde tudo é permitido...e apenas a Verdade é proibida.
Contradições humanas que preferem um doce veneno a um remédio amargo, mas salutar. Negar-se a si mesmo e aceitar a autoridade que vem de Deus mexe com nosso orgulho, é amargo para a nossa natureza inclinada para o pecado, mas é o que mais pode haver de mais salutar para a nossa alma.
Os verdadeiros cristãos deste período eram obrigados a amotinar-se em lugares escondidos para a celebração da missa. Os padres não jurados arriscavam-se a ser presos; os fiéis, por sua vez, temiam pelo que lhes pudesse acontecer se fossem pegos ouvindo a estes “traidores”.
Passada esta era conturbada, a Igreja na França começaria a reflorescer.
Este pequeno texto não tinha por objetivo fazer uma análise exaustiva de todos os pontos que envolvem a Revolução Francesa, mas tão somente relatar de forma sucinta algumas das peseguições sofridas pela Igreja durante este periodo sombrio da História.
Este pequeno texto não tinha por objetivo fazer uma análise exaustiva de todos os pontos que envolvem a Revolução Francesa, mas tão somente relatar de forma sucinta algumas das peseguições sofridas pela Igreja durante este periodo sombrio da História.
Nenhuma força humana poderá contra a Santa Igreja Católica, ideologias e governos passam, são efêmeros. A Igreja jamais passará, pois Nosso Senhor lhe prometeu
et ecce ego vobiscum sum omnibus diebus, usque ad consummationem sæculi (Mt 28, 20).
Que os acontecimentos da Revolução fortaleçam a nossa fé, que Nossa Senhora dê-nos força para tudo suportar por amor a Cristo e à Sua Igreja e para jamais renunciar à Verdade.
Apenas pode haver liberdade de fato se esta estiver respaldada pela Verdade, caso contrário, trata-se de uma mera ilusão.
Apenas pode haver liberdade de fato se esta estiver respaldada pela Verdade, caso contrário, trata-se de uma mera ilusão.
Pax Domini Sit Semper Vobiscum
William Bottazzini
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