EXTRA ECCLESIAM NULLA SALUS

domingo, 20 de março de 2011

O pecado contra o Espírito Santo





Abaixo, em sua encíclica Dominum et Vivificantem, o papa João Paulo II nos explica o que é o temível pecado contra o Espírito Santo de que nos falam os Evangelhos.

Abraços,

William

______________________________________

O pecado contra o Espírito Santo

Tendo em conta tudo o que temos vindo a dizer até agora, tornam-se mais compreensíveis algumas outras palavras impressionantes e surpreendentes de Jesus. Poderemos designá-las como as palavras do "não-perdão". São-nos referidas pelos Sinóticos, a propósito de um pecado particular, que é chamado "blasfêmia contra o Espírito Santo". Elas foram expressas na tríplice redação dos Evangelistas do seguinte modo:

São Mateus: "Todo o pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito Santo não será perdoada. E àquele que falar contra o Filho do homem, ser-lhe-á perdoado; mas, a quem falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste mundo nem no futuro".

São Marcos: "Aos filhos dos homens serão perdoados todos os pecados e todas as blasfêmias que proferirem; todavia, quem blasfemar contra o Espírito Santo, jamais terá perdão, mas será réu de pecado eterno".

São Lucas: "E a todo aquele que disser uma palavra contra o Filho do homem, perdoar-se-á; mas a quem tiver blasfemado contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado".

Porquê a "blasfêmia" contra o Espírito Santo é imperdoável? Em que sentido entender esta "blasfêmia"? Santo Tomás de Aquino responde que se trata de um pecado "imperdoável por sua própria natureza, porque exclui aqueles elementos graças aos quais é concedida a remissão dos pecados".

Segundo uma tal exegese, a "blasfêmia" não consiste propriamente em ofender o Espírito Santo com palavras; consiste, antes, na recusa de aceitar a salvação que Deus oferece ao homem, mediante o mesmo Espírito Santo agindo em virtude do sacrifício da Cruz. Se o homem rejeita o deixar-se "convencer quanto ao pecado", que provém do Espírito Santo e tem caráter salvífico, ele rejeita contemporaneamente a "vinda" do Consolador: aquela "vinda" que se efetuou no mistério da Páscoa, em união com o poder redentor do Sangue de Cristo: o Sangue que "purifica a consciência das obras mortas".

Sabemos que o fruto desta purificação é a remissão dos pecados. Por conseguinte, quem rejeita o Espírito e o Sangue permanece nas "obras mortas", no pecado. E a "blasfêmia contra o Espírito Santo" consiste exatamente na recusa radical de aceitar esta remissão, de que Ele é o dispensador íntimo e que pressupõe a conversão verdadeira, por Ele operada na consciência. Se Jesus diz que o pecado contra o Espírito Santo não pode ser perdoado nem nesta vida nem na futura, é porque esta "não-remissão" está ligada, como à sua causa, à "não-penitência", isto é, à recusa radical a converter-se. Isto equivale a uma recusa radical de ir até às fontes da Redenção; estas, porém, permanecem "sempre" abertas na economia da salvação, na qual se realiza a missão do Espírito Santo. Este tem o poder infinito de haurir destas fontes: "receberá do que é meu", disse Jesus. Deste modo, Ele completa nas almas humanas a obra da Redenção, operada por Cristo, distribuindo os seus frutos. Ora a blasfêmia contra o Espírito Santo é o pecado cometido pelo homem, que reivindica o seu pretenso "direito" de perseverar no mal — em qualquer pecado — e recusa por isso mesmo a Redenção. O homem fica fechado no pecado, tornando impossível da sua parte a própria conversão e também, consequentemente, a remissão dos pecados, que considera não essencial ou não importante para a sua vida. É uma situação de ruína espiritual, porque a blasfêmia contra o Espírito Santo não permite ao homem sair da prisão em que ele próprio se fechou e abrir-se às fontes divinas da purificação das consciências e da remissão dos pecados.

A ação do Espírito da verdade, que tende ao salvífico "convencer quanto ao pecado", encontra no homem que esteja em tal situação uma resistência interior, uma espécie de impermeabilidade da consciência. um estado de alma que se diria endurecido em razão de uma escolha livre: é aquilo que a Sagrada Escritura repetidamente designa como "dureza de coração".  Na nossa época, a esta atitude da mente e do coração corresponde talvez a perda do sentido do pecado, à qual dedica muitas páginas a Exortação Apostólica Reconciliatio et Paenitentia.  Já o Papa Pio XII tinha afirmado que "o pecado do século é a perda do sentido do pecado".  E esta perda vai de par com a "perda do sentido de Deus". Na Exortação acima citada, lemos: "Na realidade, Deus é a origem e o fim supremo do homem, e este leva consigo um gérmen divino. Por isso, é a realidade de Deus que desvenda e ilumina o mistério do homem. É inútil, pois, esperar que ganhe consistência um sentido do pecado no que respeita ao homem e aos valores humanos, quando falta o sentido da ofensa cometida contra Deus, isto é, o verdadeiro sentido do pecado.

É por isso que a Igreja não cessa de implorar de Deus a graça de que não venha a faltar nunca a retidão nas consciências humanas, que não se embote a sua sensibilidade sã diante do bem e do mal. Esta retidão e esta sensibilidade estão profundamente ligadas à acção íntima do Espírito da verdade. Sob esta luz, adquirem particular eloquência as exortações do Apóstolo: "Não extingais o Espírito!". "Não contristeis o Espírito Santo!". Mas sobretudo, a Igreja não cessa de implorar, com todo o fervor, que não aumente no mundo o pecado designado no Evangelho por "blasfêmia contra o Espírito Santo"; e, mais ainda, que ele se desvie da alma dos homens — e como repercussão, dos próprios meios e das diversas expressões da sociedade — deixando espaço para a abertura das consciências, necessária para a ação salvífica do Espírito Santo. A Igreja implora que o perigoso pecado contra o Espírito Santo ceda o lugar a uma santa disponibilidade para aceitar a missão do Consolador, quando Ele vier para "convencer o mundo quanto ao pecado, quanto à justiça e quanto ao juízo.

Jesus, no seu discurso de despedida, uniu estes três domínios do "convencer", como componentes da missão do Paráclito: o pecado, a justiça e o juízo. Eles indicam o âmbito do "mistério da piedade", que na história do homem se opõe ao pecado, ao mistério da iniquidade. Por um lado, como se exprime Santo Agostinho, está o "amor de si mesmo levado até ao desprezo de Deus"; por outro, "o amor de Deus até ao desprezo de si mesmo". A Igreja continuamente eleva a sua oração e presta o seu serviço, para que a história das consciências e a história das sociedades, na grande família humana, não se rebaixem voltando-se para o pólo do pecado, com a rejeição dos mandamentos de Deus "até ao desprezo do mesmo Deus"»; mas, pelo contrário, se elevem no sentido do amor em que se revela o Espírito que dá a vida.

Aqueles que se deixam "convencer quanto ao pecado" pelo Espírito Santo, deixam-se também convencer quanto "à justiça e quanto ao juízo". O Espírito da verdade que vem em auxílio dos homens e das consciências humanas, para conhecerem a verdade do pecado, ao mesmo tempo faz com que conheçam a verdade da justiça que entrou na história do homem com a vinda de Jesus Cristo. Deste modo, aqueles que, "convencidos quanto ao pecado", se convertem sob a ação do Consolador, são, em certo sentido, conduzidos para fora da órbita do "juízo": daquele "juízo" com o qual "o Príncipe deste mundo já está julgado". A conversão, na profundidade do seu mistério divino-humano, significa a ruptura de todos os vínculos com os quais o pecado prende o homem, no conjunto do "mistério da iniquidade". Aqueles que se convertem, portanto, são conduzidos para fora da órbita do "juízo" pelo Espírito Santo, e introduzidos na justiça, que se encontra em Cristo Jesus, e está n'Ele porque a "recebe do Pai", como um reflexo da santidade trinitária. Esta justiça é a do Evangelho e da Redenção, a justiça do Sermão da Montanha e da Cruz, que opera a "purificação da consciência" mediante o Sangue do Cordeiro. É a justiça que o Pai faz ao Filho e a todos aqueles que Lhe estão unidos na verdade e no amor.

Nesta justiça o Espírito Santo, Espírito do Pai e do Filho, que "convence o mundo quanto ao pecado", revela-se e torna-se presente no homem, como Espírito de vida eterna.

terça-feira, 8 de março de 2011

DUAS COSMOGONIAS EM FACE DA CIÊNCIA – Pe. Leonel Franca, SJ



Em um ambiente tão hostil à fé e à religião como este em que vivemos, não é difícil nos depararmos com "dogmas" científicos, que não possuem qualquer prova irrefutável, que tentam derrubar a nossa fé.

Contudo, os inimigos de Deus não podem nem mesmo se dar ao luxo de serem considerados originais quando destilam seu veneno. Já no início do século passado, o padre Leonel Franca teve de empunhar sua pena para defender a fé dos ataques daqueles que têm por seu deus a ciência vacilante.

Deus nos abençoe

WIlliam

_____________________

DUAS COSMOGONIAS EM FACE DA CIÊNCIA – Pe. Leonel Franca, SJ

Dentre os problemas, que em todos os tempos, têm despertado a curiosidade investigadora do homem, nenhum há porventura, em cuja solução tanto se tenham afadigado as inteligências como o grande problema da origem das coisas. Debalde, depois de tantos milhares de anos, tentou AUGUSTO COMTE agrilhoar despoticamente a razão humana, enclausurando-a no âmbito acanhado dos problemas sensíveis: ela, filha da luz e amante da liberdade, rasgou-lhe o veto ditatorial, e hoje como ontem desprendendo o vôo livre ruma reto em busca da região serena da verdade, onde ela resplandeça, nos fenômenos sensíveis ou na sua causa invisível.

Importância do problema

A questão da origem das coisas é inseparável da existência de um Ser Supremo e Criador: eis o segredo de sua importância. O princípio de causalidade, base inconcusa sobre a qual se levanta todo o edifício de nossos conhecimentos, exige, ao aparecimento de um ser, uma causa pré-existente que lhe tenha dado origem, comunicando-lhe todas as perfeições de que é dotado. Assim, quando, depois dos grandes cataclismas por que passou o nosso globo, ainda em estado de formação, moveu a primeira célula viva a sua superfície, quando, milhares de anos mais tarde, apareceu o primeiro ato psicológico, imperfeito ainda e concretizado no mais rudimentar dos protestos, quando, em épocas mais recentes, cintilaram os fulgores da inteligência na primeira alma humana, a nossa razão, recusando admitir que o perfeito possa originar-se do imperfeito, o mais do menos, o tudo do nada, reclama a existência de uma causa superior, que todas estas perfeições possuísse em grau infinito, e que, num dado momento, por ela livremente escolhido, as comunicasse a seres distintos de si na efusão comunicativa de sua bondade.

A origem da vida, a origem do sentimento, a origem da inteligência, são outras tantas vias que nos levam aos pés do trono do Criador, e o ímpio, diante do espetáculo do universo é, mau grado seu, obrigado a repetir, no segredo de sua consciência, o de VOLTAIRE: “Le monde m’embrasse et je ne puis songer. Que cette horloge existe et n’ait pas d’horloge”. O aparecimento de todas estas perfeições – vida, sentimento, intgeligência – no tempo é hoje irrevogavelmente atestado pelas ciências experimentais e ninguém há que se atreva a negá-lo. Aí estão as estratificações geológicas e os seus fósseis, como papiros de um grande livro, a referir-nos em caracteres indeléveis a historia do nosso globo.

Ao lado, porém, do grande reino animado, cujo aparecimento temporário é evidente, avulta o imenso reino anorgânico em que, na beleza multiforme de seus aspectos e na variedade extrema de suas propriedades, se nos apresentam os minerais. Como substratum comum aos dois reinos, como sede em que se manifestam todas as propriedades e perfeições dos corpos, encontra-se a matéria. É desta matéria indefinível e sob cuja constituição tanto se há discutido, desta matéria que se metamorfoseia de mil maneiras diferentes e cujo aparecimento, perdendo-se na noite dos tempos, escapa à investigação de qualquer ciência experimental, que ora inquirimos a origem. Donde provém ela? Como e quando principiou a existir? Eis, senhores, a primeira questão que se nos antolha no grande problema da origem das coisas.

Duas opiniões

Duas doutrinas antagonistas respondem à nossa pergunta: a doutrina católica e a doutrina materialista. Todas as outras soluções não são mais que variações dos dois grandes sistemas e a um deles, em última análise, se reduzem.

Ensina-nos a fé católica que a matéria é criada, teve princípio, por um ato livre do Criador, que a fez não simultaneamente nem no estado em que hoje a vemos, mas sucessivamente em vários períodos largamente espaçados, abandonando à ação das forças criadas o seu ulterior desenvolvimento. A doutrina católica opõe-se a doutrina materialista. Seus adeptos, no propósito acirrado de excluir a Deus da origem do universo, a fim de expulsa-lo da consciência humana, dogmaticamente asseveram que a matéria é eterna – existiu, existe sempre, sem princípio nem fim. Fora dela não existe ser algum – ela é a mãe fecunda de tudo o que é; de seu seio indefinidamente feraz brotaram, após uma gestação longa como o infinito, a vida, o instinto e a inteligência pelos mesmos processos por que tinham pululado a princípio todas as outras energias corpóreas. Sujeita a tais fatores, imutáveis, necessários e inexoráveis, ela se vai continuamente transformando, aperfeiçoando, evoluindo numa tendência irresistível para um termo que lhe não será dado jamais atingir.

Tal, em duas palhetadas, o sistema cosmogônico que, em nome da ciência moderna, pretendemos encampar à turba desacantilada das inteligências ainda em flor, os HAECHEL, FEUERBACH, BÜCHNER, MOLOSCHOTT e outros. Infelizmente, nem o mérito da originalidade lhes podemos conceder. Neste ponto não fizeram senão repetir em novos termos e ouropéis o que balbuciaram DEMÓCRITO, LEUCIPO e EPICURO na Grécia, quando a filosofia ainda se achava envolvida nas faixas da infância.

Contra a tese materialista nos insurgimos não somente em nome da fé que nos dá a nós católicos a certeza transcedente e infalível baseada no testemunho do que é a Sabedoria Infinita, que se não engana, a Bondade Inefável, que nos não quer enganar, senão também em nome da razão, ultrajada em seus princípios e da ciência que eles, debalde, tentam arrastar à infelicidade ignominiosa de seus preconceitos.

1ª Parte: A cosmogonia materialista é contra a razão

Disse que o materialismo ultraja a razão e vo-lo provo. Segui-me por um momento na análise dum ser eterno. Desta análise jorrará a luz que nos há de aclarar o caminho da verdade.

Um ser eterno e incriado fora do qual não existe ser algum é um ser Necessário, quero dizer, e cuja não-existência é inconcebível. Tal, certamente, não é a matéria, contingente em cada uma de suas partes, contingente no conjunto de todas elas. Todos estes seres distintos que aí vemos a povoar o mundo são dependentes uns dos outros, relativos, reciprocamente condicionados, de tal sorte que não poderia haver nenhum deles existir sem o concurso simultâneo e harmonioso dos que o condicionam; numa palavra, todos os seres que constituem o mundo material e com os quais se identifica a matéria apresentam à razão todos os caracteres de contingência, seres todos que poderiam não existir sem que nisto enxergasse a nossa inteligência o mínimo vislumbre de contradição. Eis a primeira incompatibilidade da matéria com o ser eterno.

Mais. O ser eterno e necessário é necessariamente infinito, não só na duração senão também na perfeição, na posse completa da plenitude do ser. Senão dizei-me: por que razão haveria de ser limitado e finito um ser necessário, por que se haveria de restringir a sua perfeição a este ou aquele grau? Porventura pela vontade onipotente de outro ser distinto? Mas então ele não seria o ser único e independente que dizem os materialistas ser a sua matéria. Acaso intrinsecamente pela sua própria essência? Mas, se esta essência é a plenitude do ser, encerra e comporta todas as perfeições possíveis, porque há de rejeitar uma delas? Inconcebível. De qualquer lado que nos viremos, emaranha-se a nossa razão em dificuldade intricadas, em flagrantes contradições e não em dificuldades intricadas, em flagrantes contradições e não nos é possível conceber num ser Eterno, Necessário e Independente que ao mesmo tempo infinito não seja e infinitamente perfeito.

Nem ainda é tudo. Outro atributo do ser eterno e infinito é a imutabilidade. Todo ser que mude adquire um novo estado e com ele uma perfeição que não possuía: a mutabilidade é o sigilo inconfundível dos seres imperfeitos e limitados. No ente infinito, pego insondável de todas as perfeições, não há razão alguma de movimento, nem, portanto, de mudança. A matéria, caracterizada pela mobilidade e instabilidade que todos lhe concedemos, repete, portanto, de si a infinidade eterna.

Terminaremos a nossa breve excursão pelos domínios da filosofia, pela análise abstrata dos conceitos: não nos foi infrutífera. Nos argumentos que esboçamos mostrou-nos a razão o absurdo da concepção materialista de um cosmos eterno e necessário em provas hauridas não no terreno incerto e movediço das ciências experimentais, mas estribados nas próprias leis do pensamento, eternas e imutáveis como imutável e eterna é a verdade de que são expressões. Qualquer inteligência mediocremente cultivada pode, nestas especulações, seguir de perto um ARISTÓTELES, o um AGOSTINHO, um PLATÃO e um BOSSUET. Pouco se nos dá, que, fechando substancialmente os olhos, digam os materialistas que não vêem a luz. É uma triste e dolorosa verdade, para nossa desventura, que a vontade do homem, nos abismos insondáveis de sua malícia, envolve não raro a inteligência de tão espessa nuvem de fumo que lhe obscurece o lume da razão natural e de todo lhe embota a agudeza de penetração. Não entremos, porém, neste conluio horrível, em que as duas faculdades espirituais do homem (inteligência e vontade) mancomunado o mais nefando dos atentados – o suicídio da consciência moral – associam-se para imprimir uma orientação errada à vida de um homem. Só um juiz infinitamente clarividente e justo pode com equidade discernir a imputabilidade e assinar a cada homem que consuma a própria perdição, o seu quinhão de responsabilidades.

2ª Parte: A cosmogonia materialista é contra as ciências.

A estes argumentos peremptórios muitos materialistas, encolhendo ironicamente os ombros, contentam-se com responder: é metafísica, como se pudera existir verdadeira ciência, como se pudera travar uma discussão sem ser metafísica.

Desçamos, porém, a região das ciências pelas quais unicamente eles batem pé e em cuja infalibilidade juram incondicionalmente. Combatendo no campo das matemáticas e das ciências experimentais, cremos ainda ter armas suficientes para pugnar vitoriosamente contra o dogma fundamental do materialismo: a eternidade da matéria.

Comecemos pela matemática. Aceitam, e com razão, os mais notáveis matemáticos que uma série infinita de números repugna: é uma contradição que decorre da noção mesma de número. Sendo este essencialmente uma coleção de unidades, que não vê o absurdo de chegar ao infinito pelo acréscimo de unidade a um número infinito? Todos conhecem a demonstração de GALILEU a este respeito, repetida e ilustrada pelo maior matemático do século XIX, na frase de BERTRAND, pelo grande sábio e maior católico, CAUCHY. Termina ele a sua demonstração afirmando que a “hipótese de uma série prolongada ao infinito arrasta contradições manifestas, e por isso deve ser rejeitada (CAUCHY, Sete lições de Física Geral). Ora, precisamente a esta hipótese e que nos leva a afirmação materialista da eternidade da matéria. Fora ela eterna, como ante o dizer deles, e as mudanças por que tem passado constituíram uma série infinita, cujo primeiro termo seria o momento atual.

Demos uma forma mecânica a demonstração. Afirmam os materialistas que o movimento, sendo intimamente unido à matéria, é com ela eterno, necessário, e causa de todas as transformações por que até hoje tem passado. Ora, podendo a trajetória de um movimento ser apresentada por uma linha infinita, afirmamos que, a um móvel, é impossível ter percorrido semelhante linha. Efetivamente, suponhamos por sentido inverso. Sendo o sentido uma acidentalidade no movimento que lhe não altera a espécie, a suposição é legítima. Pois bem, partindo do ponto atual B, o móvel nunca chegará a percorrer toda a linha, que, por hipótese, é infinita, sem ponto inicial A. Mas a distância de B a A é evidentemente a mesma de A a B. Se, portanto, o móvel, partindo de B, nunca chegará a A, nunca teria chegado a B se tivesse realmente partido de A, isto é, de um ponto situado no infinito. Conclusão: o mundo, que se acha atualmente no estado B de sua evolução, teve um ponto inicial de partida, seu movimento não é eterno.

Das matemáticas passemos à Física. Os dois grandes princípios da conservação e da degradação da energia, generalização dos dois outros princípios sobre que se baseia a Termodinâmica e conhecidas pelos nomes dos seus autores MAYER e CARNOT, podem ser considerados como os princípios fundamentais da Física moderna. Deles se colige que todo o universo tende para um estado final de equilíbrio.

A soma da energia atual e potencial do universo permanece constante através de todas as suas transformações. Nestas contínuas transições, porém, a energia, convertendo-se, tende a tornar-se sempre mais difusa e menos intensa: a energia química, desenvolvida no ato de uma combinação, pode manifestar-se externamente sob a forma de luz, a luz irradia calor, o calor difunde-se, e a energia primitiva, destarte, depois de passar por várias formas porque vai passando a energia há uma gradação: a ínfima de todas as formas, a menos convertível de todas é o calor, e para esta forma tende sempre, a energia nas suas transformações. É este o princípio da entropia tão bem ilustrado por W. THOMPSON, depois L. Kelvin. Assim chegará para o universo um dia em que todas as suas energias – luz, magnetismo, eletricidade, afinidade química, radioatividade e outras talvez que a natureza esconde em seu seio, terão descido ao nível mais baixo. O calor, irradiando, será igualmente distribuído por todos os corpos. A energia não será perdida, mas, assim transformada, não se poderá manifestar; a recíproca atividade dos corpos, que supõe uma desigualdade entre o ativo e o passivo, será então impossível. Um sono de morte pousará sobre o universo e o eterno silêncio dos túmulos sucederá às harmonias da grande máquina no seu eterno repouso. Para chegarmos a este estado, serão necessários séculos supranumeráveis, mas não infinitos, passará uma duração incalculável depois da qual, a tendência universal para o equilíbrio ou igualdade de potencial terá atingido o termo para o qual corremos incessantemente.

Ora, senhores, entre estes resultados da Física moderna e a hipótese materialista não há conciliação possível. Fôra a matéria eterna, e já de há muito devêramos ter chegado a este estado final de equilíbrio: o efeito necessário de uma causa é, necessariamente é, necessariamente, eterno. Ouçamos um dos melhores físicos modernos: “Se a matéria e o movimento foram eternos”, pondera NAVILLE, “o movimento que se quisesse tomar como ponto de partida, teria antes de si uma duração infinita. O mundo, por conseguinte, deveria ter chegado ao estado atual em um momento qualquer de sua duração, já que naquele momento teria tido o tempo necessário para chegar ao presente estado. Onde se faz entrar o pensamento da eternidade desaparece todo o ponto de partida e à ciência há mister um ponto de partida (Physique Moderne)”. Podemos, portanto, concluir com CAUCHY: “Assim, a ciência nos conduz ao que a fé nos ensina. A matéria não é eterna; e, se as divinas escrituras não nos tiveram claramente revelado esta verdade no primeiro e mais antigo de todos os livros, seríamos obrigados a admiti-la como físicos (Sete lições de Física Geral)”. E neste parecer concertam os mais ilustres sábios modernos e não modernos (FAYE, HIRN, HERSCHEL).

Recaptulação final

É tempo de concluir. Colocamos em face da razão e da ciência as duas cosmogonias antagonistas em que se resumem todas as outras: a cosmogonia mosaica, que é a  católica, e a cosmogonia materialista. Não resistiram ambas igualmente que a submetemos. A primeira aparece-nos cercada dos esplendores da verdade, atestanto sua origem divina; a outra, no primeiro contato da discussão, caiu pulverizada e desfeita em cinzas, como estes cadáveres que aparecem intactos ao abrir um sarcófago, para se desfazerem logo num punhado de pó informe e sem recordações ao primeiro sopro de um ser animado.

Existe um ser desde toda a eternidade: é este um princípio de evidência incontestável e matemática. Se supuséramos que, por um só momento, nada existiu, nenhuma coisa poderia jamais ter começado a existir, porque do nada não se pode produzir coisa alguma: ex nihilo nihil fit. Este ser eterno não pode ser a matéria limitada e contingente, mutável e imperfeita, composta e divisível, extensa no espaço e sucessiva no tempo, ela não possui nenhum dos atributos do ser eterno; as suas propriedades, as leis que lhe regem os movimentos atestam, evidentemente, a sua origem, temporal.

O ser eterno, Ato Puro, que envolve a existência na própria essência, ser Infinito, não sujeito às vicissitudes da mutabilidade, independente do espaço e dos tempos, isento de toda e qualquer composição, plenitude do ser, pélago sem fundo nem margens de todas as perfeições. Só tal ser Eterno e este ser é o nosso Deus. Abençoemos a ciência que assim nos leva ao trono de sua Majestade Infinita, ciência que dignifica, que ilustra a inteligência e fortalece a vontade, ciência que exalta e enaltece o homem, apontando-lhe a sublimidade de sua origem e a elevação dos seus destinos.

 *Conferência na Congregação Nossa Senhora das Vitórias, 1916.

Fonte: Pe. Leonel Franca S. J. Obras completas (Tomo V: Alocuções e artigos II); p. 129-139. Ed. Agir, Rio, 1954.

terça-feira, 1 de março de 2011

Método de São Luís de Montfort para se meditar o Rosário





Método abreviado para celebrar a vida, a morte e a glória de Jesus e de Maria durante a recitação do Santo  Rosário, e para diminuir as distrações da imaginação.


Deve-se acrescentar à cada Ave Maria de cada dezena uma pequena palavra que nos traga à memória o mistério que se celebra ao longo da dezena; e deve-se acrescentar esta palavra após dizer Jesus no meio do Ave Maria.

Na 1° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus encarnado;
Na 2° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus santificante;
Na 3° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus menino pobre;
Na 4° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus sacrificado;
Na 5° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus santo dos santos.
(fim do primeiro terço)

Na 6° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus agonizante;
Na 7° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus flagelado;
Na 8° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus coroado de espinhos;
Na 9° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus portando a sua cruz;
Na 10° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus crucificado.
(fim do segundo terço)

Na 11° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus ressuscitado;
Na 12° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus subindo aos céus;
Na 13° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus que vos do Espírito Santo;
Na 14° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus que vos ressuscita;
Na 15° dezena: (...) bendito o fruto de vosso ventre, Jesus que vos coroa.
(fim do terceiro terço)

Em seguida, ao terminar o primeiro terço se diz: Graça dos mistérios gozosos, descei em nossas almas e fazei delas almas verdadeiramente santas. Ao terminar o segundo: Graça dos mistérios dolorosos, descei em nossas almas e fazei delas almas verdadeiramente pacientes. Ao terminar o terceiro: Graça dos mistérios gloriosos, descei em nossas almas e fazei delas almas eternamente bem-aventuradas.Amém.