EXTRA ECCLESIAM NULLA SALUS

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Grupo de Estudos em Pouso Alegre


Convidamos você, que está fazendo curso superior ou que já está formado, a fazer parte do nosso grupo de estudos católicos. Vamos debater sobre temas teológicos, filosóficos e históricos. Os encontros acontecerão uma vez por mês em: 20/08; 17/09; 15/10; 12/11 e 08/12. Interessados , para maiores informações, favor entrar em contato através do e-mail: williambottazzini@yahoo.com.br.


MÊS

DIA

TEMAS

AGOSTO

20
Provas da Existência de Deus
O problema da Verdade
A Criação e a entrada do pecado no mundo.
O mundo antes de Cristo


SETEMBRO

17
A Encarnação do Verbo
Maria: mãe de todos nós.
Ensinamentos de Jesus.
A fundação da Igreja.
O sacrifício redentor


OUTUBRO

15
 O Espírito Santo
A Igreja
Os primeiros cristãos
A Bíblia

NOVEMBRO

12
Batismo
Eucaristia
Confirmação
Penitência
Unção dos Enfermos

DEZEMBRO

8
Matrimônio
Ordem



São Tomás de Aquino e Santo Agostinho, rogai por nós!

William

terça-feira, 21 de junho de 2011

Fé e Obras



Será que há oposição entre   São Tiago e São Paulo  no tocante à fé e as às obras? Cf. Tg 2,24 e Ef 2, 8-10.

Não há oposição. São Paulo fala da entrada na amizade de Deus, fundamental para a salvação, que é gratuita, ou seja, não pode ser comprada com obras. Ninguém pode dizer: "Deus me ama porque eu fiz isso e aquilo!". 

São Tiago, por sua vez, trata da permanência na amizade de Deus, que também é essencial para a salvação, e que é demonstrada através das boas obras. Conforme nos ensina o próprio Jesus: "Se me amais, guardareis os meus mandamentos" (Jo 14, 15). Guardar os mandamentos é a prova que damos de que amamos verdadeiramente a Deus e de que queremos estar com Ele eternamente, ou seja, de que queremos ser salvos. Não adianta nada falar que tem fé, que ama a Deus e cometer  todo o tipo de torpezas com a consciência tranquila. As atitudes de desobediência e a falta de arrependimento mostrarão que nem o amor nem a fé são sinceros. 

Mas, mesmo sem praticar nenhuma obra e com inúmeros pecados, Deus nos ama e nos chama para Ele. Cabe a nós respondermos a esse chamado, arrependendo-nos de nossos pecados, aceitando a graça de Deus e praticando boas obras.

É por isso que não há discordância entre São Tiago e São Paulo quando tratam de Abraão. Cf. Tg 2, 23; Rm 4,3; Gl 3,6 e Gn 15,6.

Nem Tiago nem Paulo consideram a fé de Abraão como uma obra. Em ambos, Abraão foi justificado pela fé, quando não havia ainda a Lei e, destarte, não podia apresentar a Deus nenhuma obra. Abraão não “comprou” a amizade de Deus com obras. Pois, mais uma vez, ninguém pode comprar o amor de Deus.

São Paulo ainda apresenta Abraão como pai de todos os que creem em Rm 4, 1s. 

Abraão respondeu positivamente ao chamado de Deus e entrou em amizade com Ele mesmo antes da Lei, ou seja, não possuía as obras da Lei para poder justificar a graça recebida de Deus. Assim, todos os que crêem, ou seja, todos os que dizem “sim” a Deus, agem como Abraão. E esta resposta positiva deve ser traduzida pelas obras.


Fiquemos com Deus,


William

terça-feira, 31 de maio de 2011

Fora da Igreja não há salvação



Esta frase sempre levanta polêmicas. Mas o que realmente ela quer dizer?

Vejamos o que nos diz o Catecismo da Igreja Católica:

846. Como deve entender-se esta afirmação, tantas vezes repetida pelos Padres da Igreja? Formulada de modo positivo, significa que toda a salvação vem de Cristo-Cabeça pela Igreja que é o seu Corpo:
O santo Concílio "ensina, apoiado na Sagrada Escritura e na Tradição, que esta Igreja, peregrina na terra, é necessária à salvação. De fato, só Cristo é mediador e caminho de salvação. Ora, Ele torna-Se-nos presente no seu Corpo, que é a Igreja. Ao afirmar-nos expressamente a necessidade da fé e do Batismo, Cristo confirma-nos, ao mesmo tempo, a necessidade da própria Igreja, na qual os homens entram pela porta do Batismo. É por isso que não se podem salvar aqueles que, não ignorando que Deus, por Jesus Cristo, fundou a Igreja Católica como necessária, se recusam a entrar nela ou a nela perseverar".
847. Esta afirmação não visa aqueles que, sem culpa da sua parte, ignoram Cristo e a sua igreja:
"Com efeito, também podem conseguir a salvação eterna aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo e a sua Igreja, no entanto procuram Deus com um coração sincero e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir a sua vontade conhecida através do que a consciência lhes dita".
848. "Muito embora Deus possa, por caminhos só d'Ele conhecidos, trazer à fé, "sem a qual é impossível agradar a Deus", homens que, sem culpa sua, ignoram o Evangelho, a Igreja tem o dever e, ao mesmo tempo, o direito sagrado, de evangelizar" todos os homens.

Embora o texto seja suficientemente claro, cabem aqui algumas observações:

1) Cristo é o nosso único Salvador, pois "Em nenhum outro há salvação, porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos." (At 4, 12). 

2) Embora seja único, Cristo não é "sozinho". Ele possui um corpo. E quem é esse corpo de Cristo? Diz São Paulo: " (...) Cristo é o chefe da Igreja, seu corpo, da qual ele é o Salvador" (Ef 5, 23). Assim seremos salvos através de Cristo, desde que estejamos unidos ao seu corpo, desde que estejamos unidos ao Cristo todo. Temos necessidade do Cristo cabeça e do corpo de Cristo.

3) Qualquer igreja é parte deste corpo? Não é o que diz São Paulo: "Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo." (Ef. 4, 5).  Isso é óbvio, pois a Verdade é única e indivisível. 

4) Mas entre tantas "fés" diferentes, como saber qual é a única verdadeira? Devemos buscar a Igreja que o próprio Cristo fundou para ser Seu corpo, pois Ele mesmo disse: "E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela". (Mt 16, 18). Apenas uma Igreja...apenas um corpo...apenas um batismo...apenas uma fé...pois somente na verdade há unidade; a multiplicidade é característica do erro. 


5) Então, a Igreja é necessária.Mas quem faz parte da Igreja? Apenas as pessoas que eu vejo na Missa ou que se declaram católicas? Não. Fazem parte da Igreja, corpo de Cristo, também todos aqueles que, embora não tenham, pelas mais diversas razões (tempo, espaço, cultura etc), participado visivelmente da Igreja, tenham vivido de alguma forma em consonância com seus ensinamentos e com os dez mandamentos. 

6) Assim sendo, uma pessoa que, sem conhecimento, vive ou viveu fora da Igreja visível, mas que teria aderido a esta mesma Igreja se houvesse conhecido acerca dela, pode, após a morte, juntar-se aos membros dessa mesma Igreja que já triunfaram, ou seja, juntar-se aos santos que estão diante de Deus. A pessoa pode, assim, salvar-se. 

7) Já aqueles que conhecendo a Igreja recusam-se a fazer parte dela, estão rejeitando o corpo de Cristo. Ora, recusar uma parte de Cristo é recusar o Cristo todo. E sem Cristo ninguém pode se salvar. Persistindo neste erro, a pessoa escolhe a própria condenação.

8) Disso resulta a importância de proclamarmos o verdadeiro Evangelho e trazermos todos à comunhão com este único Corpo de Cristo. Afinal, “Não podemos deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos.” At 4.20.

Fiquemos com Deus.

William

quarta-feira, 18 de maio de 2011

''Reforma da reforma'' na liturgia vai continuar, diz cardeal

A redução do Papa Bento XVI às restrições ao uso do Missal Romano de 1962, conhecido como rito tridentino, é apenas o primeiro passo em uma "reforma da reforma" na liturgia, disse o principal ecumenista do Vaticano.

A reportagem é de John Thavis, publicada no sítio Catholic News Service, 14-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

O objetivo de longo prazo do papa não é simplesmente permitir que os ritos velhos e novos convivam, mas ir em direção a um "rito comum", que seja moldado pelo enriquecimento mútuo das duas formas da missa, disse o cardeal Kurt Koch (foto), presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.

Com efeito, o papa está lançando um novo movimento de reforma litúrgica, disse o cardeal. Aqueles que resistem a ele, incluindo os progressistas "rígidos", veem equivocadamente o Concílio Vaticano II como uma ruptura com a tradição litúrgica da Igreja, afirmou.

O cardeal Koch fez essas declarações em uma conferência em Roma sobre a "Summorum Pontificum", a carta apostólica do Papa Bento XVI de 2007, que ofereceu uma maior amplitude para o uso do rito tridentino. O texto do cardeal foi publicado no mesmo dia pelo L'Osservatore Romano, o jornal do Vaticano.

O cardeal Koch disse que o Papa Bento acredita que as mudanças litúrgicas pós-Vaticano II trouxeram "muitos frutos positivos", mas também problemas, incluindo um foco puramente em questões práticas e uma negligência do mistério pascal na celebração eucarística. O cardeal disse que é legítimo questionar se os inovadores litúrgicos intencionalmente foram além das intenções declaradas do Concílio.

Ele disse que isso explica por que o Papa Bento XVI introduziu um novo movimento de reforma, começando com a "Summorum Pontificum". O objetivo, afirmou, é revisitar os ensinamentos do Vaticano II sobre liturgia e reforçar certos elementos, como as dimensões cristológica e sacrificial da missa.

O cardeal Koch disse que a Summorum Pontificum é "apenas o começo desse novo movimento litúrgico".

"Na verdade, o Papa Bento sabe muito bem que, a longo prazo, não podemos nos deter em uma coexistência entre a forma ordinária e a forma extraordinária do rito romano, mas que, no futuro, a Igreja, naturalmente, mais uma vez, precisará de um rito comum", disse.

"No entanto, como uma nova reforma litúrgica não pode ser decidida teoricamente, mas exige um processo de crescimento e de purificação, o papa, por enquanto, está sublinhando, acima de tudo, que as duas formas do rito romano podem e devem se enriquecer mutuamente", explicou.

O cardeal Koch disse que aqueles que se opõem a esse novo movimento de reforma e o veem como um retrocesso com relação ao Vaticano II não possuem uma compreensão apropriada das mudanças litúrgicas pós-Vaticano II. Como o papa enfatizou, o Vaticano II não foi uma quebra ou uma ruptura com a tradição, mas sim parte de um processo orgânico de crescimento, disse.

No último dia da conferência, os participantes assistiram a uma missa celebrada segundo o rito tridentino no Altar da Cátedra da Basílica de São Pedro. O cardeal Walter Brandmüller presidiu a liturgia. Foi a primeira vez, em várias décadas, que o rito antigo foi celebrado nesse altar.

http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=43387

sábado, 23 de abril de 2011

Pequena Catequese sobre a Vigília Pascal



P. José Cordeiro
Reitor do Pontifício Colégio Português

O simbolismo fundamental da celebração litúrgica da Vigília é o de ser uma “noite clara”, ou melhor «a noite que brilha como o dia e a escuridão é clara como a luz».

Na noite, em que Jesus Cristo passou da morte à vida, a Igreja convida os seus filhos a reunirem-se em vigília e oração. Na verdade, a Vigília pascal foi sempre considerada a mãe de todas a vigílias e o coração do Ano litúrgico. A sensibilidade popular poderia pensar que a grande noite fosse a noite de Natal, mas a teologia e a liturgia da Igreja adverte que é a noite da Páscoa, «na qual a Igreja espera em vigília a Ressurreição de Cristo e a celebra nos sacramentos» (Normas gerais sobre o Ano litúrgico, 20). No texto do Precônio pascal, chamado o hino “Exsultet” e que se canta nesta celebração, diz-se que esta noite é «bendita», porque é a «única a ter conhecimento do tempo e da hora em que Cristo ressuscitou do sepulcro! Esta é a noite, da qual está escrito: a noite brilha como o dia e a escuridão é clara como a luz». Por isso, desde o início a Igreja celebrou a Páscoa anual, solenidade das solenidades, com uns vigília noturna. A celebração da Vigília pascal articula-se em quatro partes: 1) a liturgia da luz ou “lucernário”; 2) a liturgia da Palavra; 3) a liturgia batismal; 4) a liturgia eucarística.

1) A liturgia da luz consiste na bênção do fogo, na preparação do círio e na proclamação do precônio pascal. O lume novo e o círio pascal simbolizam a luz da Páscoa, que é Cristo, luz do mundo. O texto do precônio evidencia-o quando afirma que «a luz de Cristo (...) dissipa as trevas de todo o mundo» e convida a «celebrar o esplendor admirável desta luz (...) na noite ditosa, em que o céu se une à terra, em que o homem se encontra com Deus!».

2) A liturgia da Palavra propõe sete leituras do Antigo Testamento, que recordam as maravilhas de Deus na história da salvação e duas do Novo Testamento, ou seja, o anúncio da Ressurreição segundo os três Evangelhos sinópticos, e a leitura apostólica sobre o Batismo cristão como sacramento da Páscoa de Cristo. Assim, a Igreja, «começando por Moisés e seguindo pelos Profetas» (Lc 24,27), interpreta o mistério pascal de Cristo. Toda a escuta da Palavra é feita à luz do acontecimento-Cristo, simbolizado no círio colocado no candelabro junto ao Ambão ou perto do Altar.

3) A liturgia batismal é parte integrante da celebração. Quando não há Batismo, faz-se a bênção da fonte batismal e a renovação das promessas do Batismo. Do programa ritual consta, ainda, o canto da ladainha dos santos, a bênção da água, a aspersão de toda a assembléia com a água benta e a oração universal. A Igreja antiga batizava os catecúmenos nesta noite e hoje permanece a liturgia batismal, mesmo sem a celebração do Batismo.

4) A liturgia eucarística é o momento culminante da Vigília, qual sacramento pleno da Páscoa, isto é, a memória do sacrifício da Cruz, a presença de Cristo Ressuscitado, o ápice da Iniciação cristã e o antegozo da Páscoa eterna.

Estes quatro momentos celebrativos têm como fio condutor a unidade do plano de salvação de Deus em favor dos homens, que se realiza plenamente na Páscoa de Cristo por nós. Por consequência, a Ressurreição de Cristo é o fundamento da fé e da esperança da Igreja.

Gostaria de destacar dois elementos expressivos desta solene vigília: a luz e a água.

A Vigília na noite santa abre com a liturgia da luz, evocando a ressurreição de Cristo e a peregrinação de Israel guiado pela coluna de fogo. A liturgia salienta a potência da luz, como o símbolo de Cristo Ressuscitado, no círio pascal e nas velas que se acendem do mesmo, na iluminação progressiva das luzes da igreja, ao acender das velas do altar e com as velas acesas na mão para a renovação das promessas batismais. O símbolo mais iluminador é o círio, que deve ser de cera, novo cada ano e relativamente grande, para poder evocar que Cristo é a luz dos povos. Ao acender o círio pascal do lume novo, o sacerdote diz: «A luz de Cristo gloriosamente ressuscitado nos dissipe as trevas do coração e do espírito» e depois apresenta o círio como «lumen Christi=a luz de Cristo». Quando alguém nasce, costuma-se dizer que «veio à luz» ou que «a mãe deu à luz». Podemos, por isso dizer que a Igreja veio à luz na Páscoa de Cristo. De fcto, toda a vida da Igreja encontra a sua fonte no mistério da Páscoa de Cristo.

A água na liturgia é, igualmente, um símbolo muito significativo. «A água é rica de mistério» (R. Guardini). Ela é simples, pura, limpa e desinteressada. Símbolo perfeito da vida, que Deus preparou, ao longos dos tempos, para manifestar melhor o sentido do Batismo. A oração da bênção da água faz memória da ação salvífica de Deus na história através da água. Com efeito, a água é abençoada, para que o homem, criado à imagem e semelhança de Deus, «no sacramento do Batismo seja purificado das velhas impurezas e ressuscite homem novo pela água e pelo Espírito Santo». Na tradição eclesial, a fonte batismal é comparada ao seio materno e a Igreja à mãe que dá à luz

O simbolismo fundamental da celebração litúrgica da Vigília é o de ser uma “noite clara”, ou melhor «a noite que brilha como o dia e a escuridão é clara como a luz». Esta noite inaugura o “Hodie=Hoje” da liturgia, como se tratasse de um único dia de festa sem ocaso (o dia da celebração festiva da Igreja que se prolonga pela oitava pascal e pelos cinquenta dias do Tempo pascal), no qual se diz «eis o dia que fez o Senhor, nele exultemos e nos alegremos» (Sl 118).

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Bento XVI e a Unidade dos Cristãos



Reproduzo abaixo, na íntegra, a homilia proferida pelo Santo Padre durante a Santa Missa na Ceia do Senhor  realizada ontem, 21 de abril de 2011, na Basílica de São João de Latrão.

Reflitamos e fiquemos com Deus

William
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Amados irmãos e irmãs!


"Desejei ardentemente comer convosco esta Páscoa, antes de padecer" (Lc 22, 15): com estas palavras Jesus inaugurou a celebração do seu último banquete e da instituição da sagrada Eucaristia. Jesus foi ao encontro daquela hora, desejando-a. No seu íntimo, esperou aquele momento em que haveria de dar-Se aos seus sob as espécies do pão e do vinho. Esperou aquele momento que deveria ser, de algum modo, as verdadeiras núpcias messiânicas: a transformação dos dons desta terra e o fazer-Se um só com os seus, para os transformar e inaugurar assim a transformação do mundo. No desejo de Jesus, podemos reconhecer o desejo do próprio Deus: o seu amor pelos homens, pela sua criação, um amor em expectativa. O amor que espera o momento da união, o amor que quer atrair os homens a si, para assim realizar também o desejo da própria criação: esta, de fato, aguarda a manifestação dos filhos de Deus (cf. Rm 8, 19). Jesus deseja-nos, aguarda-nos. E nós, temos verdadeiramente desejo d’Ele? Sentimos, no nosso interior, o impulso para O encontrar? Ansiamos pela sua proximidade, por nos tornarmos um só com Ele, dom este que Ele nos concede na sagrada Eucaristia? Ou, pelo contrário, sentimo-nos indiferentes, distraídos, inundados por outras coisas? Sabemos pelas parábolas de Jesus sobre banquetes, que Ele conhece a realidade dos lugares que ficam vazios, a resposta negativa, o desinteresse por Ele e pela sua proximidade. Os lugares vazios no banquete nupcial do Senhor, com ou sem desculpa, há já algum tempo que deixaram de ser para nós uma parábola, tornando-se uma realidade, justamente naqueles países aos quais Ele tinha manifestado a sua proximidade particular. Jesus sabia também de convidados que viriam sim, mas sem estar vestidos de modo nupcial: sem alegria pela sua proximidade, fazendo-o somente por costume e com uma orientação bem diversa na sua vida. São Gregório Magno, numa das suas homilias, perguntava-se: Que gênero de pessoas são aquelas que vêm sem hábito nupcial? Em que consiste este hábito e como se pode adquiri-lo? Eis a sua resposta: Aqueles que foram chamados e vêm, de alguma maneira têm fé. É a fé que lhes abre a porta; mas falta-lhes o hábito nupcial do amor. Quem não vive a fé como amor, não está preparado para as núpcias e é expulso. A comunhão eucarística exige a fé, mas a fé exige o amor; caso contrário, está morta, inclusive como fé.

Sabemos pelos quatro Evangelhos, que o último banquete de Jesus, antes da Paixão, foi também um lugar de anúncio. Jesus propôs, uma vez mais e com insistência, os elementos estruturais da sua mensagem. Palavra e Sacramento, mensagem e dom estão inseparavelmente unidos. Mas, durante o último banquete, Jesus sobretudo rezou. Mateus, Marcos e Lucas usam duas palavras para descrever a oração de Jesus no momento central da Ceia: eucharistesas e eulogesas – agradecer e abençoar. O movimento ascendente do agradecimento e o movimento descendente da bênção aparecem juntos. As palavras da transubstanciação são uma parte desta oração de Jesus. São palavras de oração. Jesus transforma a sua Paixão em oração, em oferta ao Pai pelos homens. Esta transformação do seu sofrimento em amor possui uma força transformadora dos dons, nos quais agora Jesus Se dá a Si mesmo. Ele no-los dá, para nós e o mundo sermos transformados. O objetivo próprio e último da transformação eucarística é a nossa transformação na comunhão com Cristo. A Eucaristia tem em vista o homem novo, com uma novidade tal que assim só pode nascer a partir de Deus e por meio da obra do Servo de Deus.

A partir de Lucas e sobretudo de João, sabemos que Jesus, na sua oração durante a Última Ceia, dirigiu também súplicas ao Pai – súplicas que, ao mesmo tempo, contêm apelos aos seus discípulos de então e de todos os tempos. Nesta hora, queria escolher somente uma súplica que, segundo João, Jesus repetiu quatro vezes na sua Oração Sacerdotal. Como O deve ter angustiado no seu íntimo! Tal súplica continua sem cessar sendo a sua oração ao Pai por nós: trata-se da oração pela unidade. Jesus diz explicitamente que tal súplica vale não somente para os discípulos então presentes, mas tem em vista todos aqueles que hão-de acreditar n’Ele (cf. Jo 17, 20). Pede que todos se tornem um só, "como Tu, ó Pai, estás em Mim, e Eu em Ti, que eles também estejam em nós, para que o mundo acredite" (Jo 17, 21). Só pode haver a unidade dos cristãos se estes estiverem intimamente unidos com Ele, com Jesus. Fé e amor por Jesus: fé no seu ser um só com o Pai e abertura à unidade com Ele são essenciais. Portanto, esta unidade não é algo somente interior, místico. Deve tornar-se visível; tão visível que constitua para o mundo a prova do envio de Jesus pelo Pai. Por isso, tal súplica tem escondido um sentido eucarístico que Paulo pôs claramente em evidência na Primeira Carta aos Coríntios: "Não é o pão que nós partimos uma comunhão com o Corpo de Cristo? Uma vez que existe um só pão, nós, que somos muitos, formamos um só corpo, visto participarmos todos desse único pão" (1 Cor 10, 16-17). Com a Eucaristia, nasce a Igreja. Todos nós comemos o mesmo pão, recebemos o mesmo corpo do Senhor, e isto significa: Ele abre cada um de nós para além de si mesmo. Torna-nos todos um só. A Eucaristia é o mistério da proximidade e comunhão íntima de cada indivíduo com o Senhor. E, ao mesmo tempo, é a união visível entre todos. A Eucaristia é sacramento da unidade. Ela chega até ao mistério trinitário, e assim cria, ao mesmo tempo, a unidade visível. Digamo-lo uma vez mais: a Eucaristia é o encontro pessoalíssimo com o Senhor, e no entanto não é jamais apenas um ato de devoção individual; celebramo-la necessariamente juntos. Em cada comunidade, o Senhor está presente de modo total; mas Ele é um só em todas as comunidades. Por isso, fazem necessariamente parte da Oração Eucarística da Igreja as palavras: "una cum Papa nostro et cum Episcopo nostro". Isto não é um mero acréscimo exterior àquilo que acontece interiormente, mas expressão necessária da própria realidade eucarística. E mencionamos o Papa e o Bispo pelo nome: a unidade é totalmente concreta, tem nome. Assim, a unidade torna-se visível, torna-se sinal para o mundo, e estabelece para nós mesmos um critério concreto.

São Lucas conservou-nos um elemento concreto da oração de Jesus pela unidade: "Simão, Simão, Satanás reclamou o poder de vos joeirar como ao trigo. Mas Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça. E tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos" (Lc 22, 31-32). Com pesar, constatamos novamente, hoje, que foi permitido a Satanás joeirar os discípulos visivelmente diante de todo o mundo. E sabemos que Jesus reza pela fé de Pedro e dos seus sucessores. Sabemos que Pedro, que através das águas agitadas da história vai ao encontro do Senhor e corre perigo de afundar, é sempre novamente sustentado pela mão do Senhor e guiado sobre as águas. Mas vem depois um anúncio e uma missão. "Tu, uma vez convertido...". Todos os seres humanos, à exceção de Maria, têm continuamente necessidade de conversão. Jesus prediz a Pedro a sua queda e a sua conversão. De que é que Pedro teve de converter-se? No início do seu chamamento, assombrado com o poder divino do Senhor e com a sua própria miséria, Pedro dissera: "Senhor, afasta-Te de mim, que eu sou um homem pecador" (Lc 5, 8). Na luz do Senhor, reconhece a sua insuficiência. Precisamente deste modo, com a humildade de quem sabe que é pecador, é que Pedro é chamado. Ele deve reencontrar sem cessar esta humildade. Perto de Cesareia de Filipe, Pedro não quisera aceitar que Jesus tivesse de sofrer e ser crucificado: não era conciliável com a sua imagem de Deus e do Messias. No Cenáculo, não quis aceitar que Jesus lhe lavasse os pés: não se adequava à sua imagem da dignidade do Mestre. No horto das oliveiras, feriu com a espada; queria demonstrar a sua coragem. Mas, diante de uma serva, afirmou que não conhecia Jesus. Naquele momento, isto parecia-lhe uma pequena mentira, para poder permanecer perto de Jesus. O seu heroísmo ruiu num jogo mesquinho por um lugar no centro dos acontecimentos. Todos nós devemos aprender sempre de novo a aceitar Deus e Jesus Cristo como Ele é, e não como queríamos que fosse. A nós também nos custa aceitar que Ele esteja à mercê dos limites da sua Igreja e dos seus ministros. Também não queremos aceitar que Ele esteja sem poder neste mundo. Também nos escondemos por detrás de pretextos, quando a pertença a Ele se nos torna demasiado custosa e perigosa. Todos nós temos necessidade da conversão que acolhe Jesus no seu ser Deus e ser-Homem. Temos necessidade da humildade do discípulo que segue a vontade do Mestre. Nesta hora, queremos pedir-Lhe que nos fixe como fixou Pedro, no momento oportuno, com os seus olhos benévolos, e nos converta.

Pedro, o convertido, é chamado a confirmar os seus irmãos. Não é um fato extrínseco que lhe seja confiado este dever no Cenáculo. O serviço da unidade tem o seu lugar visível na celebração da sagrada Eucaristia. Queridos amigos, é um grande conforto para o Papa saber que, em cada Celebração Eucarística, todos rezam por ele; que a nossa oração se une à oração do Senhor por Pedro. É somente graças à oração do Senhor e da Igreja que o Papa pode corresponder ao seu dever de confirmar os irmãos: apascentar o rebanho de Cristo e fazer-se garante daquela unidade que se torna testemunho visível do envio de Jesus pelo Pai.

"Desejei ardentemente comer convosco esta Páscoa". Senhor, Vós tendes desejo de nós, de mim. Tendes desejo de nos fazer participantes de Vós mesmo na Sagrada Eucaristia, de Vos unir a nós. Senhor, suscitai também em nós o desejo de Vós. Reforçai-nos na unidade convosco e entre nós. Dai à vossa Igreja a unidade, para que o mundo creia. Amen.

Fonte: http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/homilies/2011/documents/hf_ben-xvi_hom_20110421_coena-domini_po.html

domingo, 17 de abril de 2011

Se Deus existe, de onde vem o mal?



Si Deus est unde malum? Et si non est, unde bonum?  - Se Deus existe, de onde vem o mal? E se não existe, de onde vem o bem?

Estas indagações foram imortalizadas por Boécio, mas não podemos atribuir-lhe a originalidade dessas dúvidas. 

Outros já haviam proposto aquelas perguntas, e foi justamente a não compreensão ou a não aceitação do que seria o mal que conduziu indivíduos ao longo da história a construir os sistemas religiosos e filosóficos mais distantes da verdade revelada por Nosso Senhor e mantida pela Igreja. 

Entre os antigos cristãos esta objeção já era feita pelos não crentes ou por aqueles que acabavam por fundar novas doutrinas por não aceitar aquilo que havia sido ensinado pelos apóstolos e seus sucessores.

É verdade que haverá uma inconsistência aparente entre o que diz a doutrina cristã e a realidade perceptível. Para os cristãos, Deus é o Sumo Bem e este mesmo Deus que é o Sumo Bem é também o Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis. Sendo assim, se tudo o que é criado traz traços do Criador, podemos dizer, em consonância com o que diz o livro do Gêneses, que tudo o que Deus criou é bom. Logo, a criação é boa.

Mas como pode a criação ser boa e ao mesmo tempo vermos tanta gente sofrer devido às tragédias que são provocadas pelo ser humano ou pela própria natureza? Por que Deus, sendo tão bom assim, não impede que aconteça os terremotos e as catástrofes que dizimam tantos inocentes? Por que Deus permite que criminosos ceifem as vidas de tantas pessoas a cada segundo? Por que vemos tantas pessoas boas padecendo e tantos maus gozando de uma vida abundante?

Muitos heresiarcas, porém, encontraram a resposta para estes enigmas recorrendo à seguinte solução: ora, o mundo criado é incompatível com a bondade de Deus, haja vista os males existentes; logo a criação não pode ser obra de um Deus bom, assim, deve ter sido obra de um deus que era mau ou ignorante. O desenvolvimento desta tese vai ser o responsável pelo surgimento de várias cosmogonias, das quais as principais são:

a) Há um princípio bom e um princípio mau. Este é o criador do mundo, enquanto aquele se encontra em um local distante, inatingível, ou melhor, atingível apenas por poucos "eleitos" ou "escolhidos".

b) Das emanações de Deus, teria surgido uma emanação que ignorava as emanações antecedentes, julgando-se, pois, a única divindade existente e o único ser perfeito. Contudo, sendo imperfeita, esta emanação teria criado um mundo igualmente imperfeito. Daí que enquanto muitos acham que o Deus criador da Bíblia é o Ser Supremo, na verdade este se encontra em um local oculto, que apenas pode ser conhecido por uma forma de gnose (conhecimento) privilegiada. Assim, o Deus que aparece na Bíblia é apenas a emanação que se julga como único Deus sem sê-lo de fato.

c) Houve um confronto entre o princípio bom e princípio mau. Tendo o princípio mau vencido a batalha, ele encarcerou o princípio bom na matéria. Logo, as coisas criadas mantém a divindade em cárcere e é nossa missão liberá-la para que ela possa, uma vez reunidas todas as suas partes, retornar a sua morada e destruir as forças do mal. Vemos pois, que o mundo, sendo obra do princípio mau provisoriamente vencedor, é mau.

É daqui que brotam os sistemas gnósticos que influenciarão, de forma mais ou menos intensa, as mais diversas doutrinas e movimentos pelos séculos, incluindo o protestantismo, o espiritismo e o comunismo. 

Em primeiro lugar, a desordem encontrada no mundo não foi obra de Deus, mas do homem que abriu as portas para a entrada do pecado e para o desequilíbrio na criação. 

A seguir, devemos notar que se mesmo com o pecado no mundo este continuasse a ser um "paraíso", o ser humano deixaria de querer e amar a Deus, que é o Sumo Bem. Mas, para ser salvo é necessário querer  e amar a Deus, ora, no caso de um paraíso terrestre, ninguém se salvaria. O cristão vê o mundo como um local de peregrinação. É neste local que ele deve traçar o seu caminho visando a sua salvação que nada mais é do que passar a eternidade ao lado de Deus. É o próprio amor de Deus que permite o mal acontecer para que possamos perceber também a existência do bem, e, assim, procurar pela sua origem. O término desta busca deve conduzir necessariamente a Deus, que deve ser o fim último de todo ser humano. Apenas ao lado d'Ele seremos integralmente felizes.

Ademais, vale lembrar que o mal absoluto não existe. Se existisse o mau absoluto, ele possuiria um bem: o da existência. Assim, não seria o mal absoluto. Então que seria o mal? Nada mais do que o desordenamento dos  bens. Vejamos.

Sabemos que o dinheiro é um bem. Ele nos proporciona muitas coisas. Contudo há também o bem da justiça, que se encontra, em uma escala dos bens, acima do dinheiro. Pois, se eu dediquei parte do meu tempo para obter os bens que tenho, trabalhando honestamente, nada mais justo do que poder usufruir das coisas que legitimamente possuo sem que ninguém arranque-os injustamente de mim. 

Entretanto, o roubo é uma coisa má. Mas o que é o roubo? O ladrão quando rouba nada mais faz do que colocar um bem menor, o dinheiro, acima de um bem maior, a justiça. Vemos pois que o mal é a inversão dos bens. E é isso que o diabo faz. Ele inverte os bens criados por Deus. O diabo nada cria. Aliás, ele foi criado bom por Deus, foi anjo do Senhor, mas foi o primeiro a querer inverter a ordem dos bens, pois quis colocar-se acima de Deus, ou seja, ele (um bem menor) quis ser maior que Deus (o Bem Absoluto).

Na sua infinita misericórdia, Deus permite que maus indivíduos prosperem nesta vida, porque o coração destes encontra-se de tal maneira endurecido que eles já não se lembram de Deus, tornando a sua salvação quase impossível. Percebendo que estes estão prestes a se precipitar na condenação eterna, Deus permite que eles sejam felizes ao menos em parte de sua existência.

Outrossim, cabe lembrar que Deus criador de todas as coisas, é poderoso o suficiente para retirar de um acontecimento ruim um bem maior ainda.

Como disse São Tomás Morus, enquanto aguardava a sua execução:

"Nada pode acontecer-me que Deus não queira. E tudo o que Ele quer, por muito mau que nos pareça, é, na verdade, muito bom"

Para encerrar, cabe lembrar que a postura dos cristãos não pode ser de apatia diante do mal. É nosso dever contribuir para aliviar o sofrimento dos que padecem, mostrando-lhes que, independentemente de quão ruim tenha sido o ocorrido, há um Bem infinitamente maior.

Fiquemos com Deus.

Willliam